O espiritismo, como doutrina codificada por Allan Kardec no século XIX, propõe uma série de conceitos e explicações sobre a vida após a morte, a comunicação com os espíritos e as interações espirituais que podem ocorrer entre os vivos e os desencarnados. Uma dúvida comum entre os praticantes do espiritismo e pessoas interessadas no tema é sobre a possibilidade de os mortos se comunicarem conosco através de sonhos. Esta questão gera diversos questionamentos, principalmente sobre a natureza dos sonhos e a veracidade dessas experiências espirituais.
Neste artigo, vamos explorar a visão espírita sobre o assunto, explicando se é possível, ou não, que os mortos nos visitem em sonhos e qual a fundamentação doutrinária para a interpretação desse fenômeno.
O que são os sonhos segundo o espiritismo?
Antes de discutirmos diretamente sobre a possibilidade de comunicação com os mortos por meio dos sonhos, é importante entender o que os espíritas acreditam sobre o processo de sonhar. Segundo Allan Kardec, em O Livro dos Espíritos, os sonhos são fenômenos que podem ser explicados pela interação entre o espírito e o mundo espiritual, com base em nossos pensamentos, sentimentos e experiências cotidianas.
No contexto espírita, os sonhos podem ser classificados em duas grandes categorias: sonhos comuns e sonhos mediúnicos.

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Sonhos comuns são aqueles que refletem o que vivemos durante o dia, nossos medos, desejos ou preocupações. Eles têm uma explicação psicológica mais racional, sendo fenômenos da mente humana, onde a alma pode se projetar para fora do corpo, mas de maneira inconsciente, sem um caráter de comunicação espiritual direta.
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Sonhos mediúnicos são aqueles nos quais o espírito se comunica conscientemente com outros espíritos, ou até mesmo com encarnados, através de um processo de comunicação fluída e intencional. Esses sonhos podem ocorrer quando o espírito do indivíduo se encontra em sintonia com o mundo espiritual, sendo uma forma de intercâmbio entre as dimensões.
A possibilidade de contato com os mortos
No espiritismo, a comunicação com os mortos não é apenas um fenômeno teórico ou de crença popular. Kardec, em sua obra O Livro dos Espíritos, dedica várias questões à possibilidade de comunicação com os espíritos após a morte, abordando os meios pelos quais isso pode acontecer. De acordo com a doutrina espírita, o que chamamos de “morte” não é o fim do ser, mas uma transição para um novo estado, onde o espírito, ou alma, segue sua jornada espiritual.
Quando se trata de sonhos, a doutrina espírita acredita que é possível que os espíritos dos mortos nos visitem, mas isso não é algo garantido ou uma regra. A comunicação em sonhos pode ocorrer quando há uma afinidade entre o espírito desencarnado e o encarnado, ou quando existe um propósito específico para essa visita. Isso pode ser explicado por várias razões, como um desejo de consolar o ente querido, de transmitir uma mensagem ou até mesmo de revisar questões não resolvidas durante a vida terrestre.
Kardec, em O Livro dos Médiuns, esclarece que a mediunidade pode se manifestar de várias formas, inclusive no plano dos sonhos. No entanto, ele destaca que o processo de comunicação depende da capacidade do médium (ou da pessoa que recebe a mensagem) em sintonizar com os espíritos e também do tipo de espírito que se manifesta. Espíritos de maior elevação, por exemplo, têm maior facilidade em se comunicar de forma clara e consciente, enquanto espíritos de menos desenvolvimento podem se manifestar de maneira confusa ou até mesmo induzir a sonhos perturbadores.
Como acontece a comunicação nos sonhos?
De acordo com a doutrina espírita, a comunicação com os mortos em sonhos acontece, principalmente, por meio da mediunidade de sonho. Para que isso ocorra, é necessário que o indivíduo esteja em um estado de sintonia com o plano espiritual, o que pode ser influenciado pela afeição e pela ligação que existe entre os encarnados e os desencarnados.
Quando o espírito desencarnado deseja comunicar-se com um ente querido, ele pode utilizar a energia mental e emocional que conecta ambos, projetando-se, então, no mundo dos sonhos. A pessoa sonha com seu ente querido falecido e tem a sensação de que ele está realmente presente, transmitindo algo importante, seja uma mensagem de amor, consolo ou até de advertência.
A mediunidade no sono é uma das formas que a doutrina espírita propõe para explicar essas experiências. O médium sonhador, durante o sono, pode ter a sua percepção ampliada e, em um estado de transe, entrar em contato com os espíritos. Essas experiências podem ser enriquecidas por uma sensação de realismo incomum, e muitas vezes a pessoa acorda com uma sensação de que o espírito realmente esteve presente. Essa sensação é resultado da forma como o espírito se comunica com o sonhador, algo que é tão vívido que chega a ser confundido com a realidade.
O que diz a doutrina espírita sobre esses encontros?
Embora a doutrina espírita reconheça que é possível, em algumas situações, que os mortos se comuniquem com os vivos através dos sonhos, ela também estabelece que nem todos os sonhos com entes queridos falecidos são, de fato, uma comunicação direta com os espíritos. Muitas vezes, esses sonhos podem ser apenas uma projeção dos nossos próprios sentimentos, desejos e necessidades emocionais. Ou seja, a saudade, o desejo de falar com o falecido e até a carga emocional não resolvida podem provocar sonhos vívidos com esses entes queridos.
Em O Livro dos Espíritos (questão 406), Kardec pergunta aos espíritos sobre a possibilidade de os mortos se comunicarem com os vivos. A resposta diz que a comunicação pode ocorrer, mas depende de vários fatores, como o estado moral e espiritual tanto do falecido quanto do encarnado. Espíritos desencarnados, em seu estado de desenvolvimento, podem se aproximar para consolar ou orientar, mas isso nem sempre acontece de maneira clara e imediata.
Diferença entre sonhos e visões mediúnicas
É importante destacar a diferença entre o que é um sonho comum e o que é uma visão mediúnica. O espiritismo acredita que as visões mediúnicas são experiências que ocorrem enquanto a pessoa está desperta e envolvem a comunicação direta entre o encarnado e o espírito, com maior clareza e objetivo. Já o sonho mediúnico acontece quando a pessoa está em estado de sono ou transe e recebe uma mensagem que, embora real, pode ser mais simbólica e menos nítida.
